O incidente de 28 de abril de 2025 foi mais do que uma falha energética. Foi um ensaio involuntário de resiliência, que colocou à prova não só os edifícios e sistemas, mas também a maturidade das organizações. Revelou vulnerabilidades, mas também boas práticas — e, acima de tudo, a urgência de um novo olhar sobre a continuidade operacional.

Planos de Continuidade e Resiliência Organizacional

Embora alguns edifícios tenham conseguido manter operações críticas, a maioria enfrentou interrupções significativas. Poucas organizações dispunham de planos de continuidade robustos, revistos recentemente ou testados em simulações realistas. O evento veio sublinhar a necessidade de planos vivos, que incluam múltiplos cenários e se articulem com fornecedores e operadores externos.

“O nosso plano estava no papel. Faltou exercitá-lo. Quando precisamos dele, percebemos que estava desatualizado.”

Além disso, ficou clara a necessidade de alinhamento entre os planos de continuidade de negócio (PCN) dos diferentes intervenientes. Um plano que preveja autonomia energética deixa de ser eficaz se depender de um fornecedor cujo próprio plano não contempla a continuidade da operação.

“O nosso PCN previa o fornecimento de gasóleo em caso de falha prolongada, mas o fornecedor não tinha instruções claras para operar nesse contexto. O elo partiu-se fora do nosso controlo.”

Este tipo de desalinhamento — muitas vezes invisível até ao momento da crise — compromete todo o sistema. A interoperabilidade dos PCNs deve ser abordada de forma colaborativa, especialmente em cadeias de fornecimento críticas, como energia, segurança e telecomunicações.

 

Autonomia Energética e Riscos Associados

Alguns edifícios ativaram geradores ou UPS com sucesso, assegurando funcionamento temporário de sistemas críticos. Outros encontraram dificuldades inesperadas: geradores que não arrancaram, autonomia aquém do necessário, ou falhas em transferências automáticas. A dependência de tecnologias cada vez mais interligadas e a ilusão de resiliência sem manutenção e testes regulares foram alertas frequentes.

“A nossa UPS funcionou, mas a rede de dados caiu logo depois. A cadeia é tão forte quanto o seu elo mais fraco.”

Infraestruturas Partilhadas e Impacto em Cadeia

Alguns edifícios de serviços críticos, como saúde ou telecomunicações, conseguiram manter-se funcionais graças a infraestruturas redundantes. No entanto, o impacto em cadeia — desde portarias automáticas a sistemas de vigilância e ventilação — gerou efeitos secundários inesperados. A interoperabilidade entre sistemas e a priorização de cargas essenciais mostraram-se pontos-chave a rever.

“Descobrimos que o controlo de acessos estava na mesma linha elétrica do parque. Quando a energia caiu, perdemos os dois.”

Capacidade de Aprendizagem e Cultura de Melhoria Contínua

Vários dos profissionais ouvidos referiram já estar a rever procedimentos, a convocar fornecedores e a atualizar planos. Esta capacidade de aprendizagem rápida, aliada à partilha de experiências entre pares, é um dos sinais mais promissores. Há uma consciência crescente de que a resiliência é um processo — e não um estado final.

“Estamos a aproveitar o que correu mal como combustível para melhorar. O pior seria ignorar este aviso.”

Notas Finais

A resiliência não se constrói no momento da falha — constrói-se nos dias, meses e anos que a antecedem. O apagão de abril foi uma chamada de atenção para todos os que gerem ativos, pessoas e operações. Cabe agora a cada organização transformar este episódio num ponto de viragem.

A APFM – Associação Portuguesa de Facility Management agradece aos 21 profissionais que contribuíram, em tempo recorde, com testemunhos valiosos para esta série de artigos. A sua generosidade em partilhar experiências ajudará todo o setor a crescer e a preparar-se melhor para os desafios do futuro.

 

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